quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

 O prédio da esquina Lachocaya Inóbilis


Um velho apartamento no centro da cidade, não se sabia o que era mais antigo, se a cidade ou o prédio. Ele ficava em uma esquina, logo a frente encontrava-se a praça, bela, porém decadente, fizeram daquilo uma tristeza, um ar mórbido. Algumas crianças em dias quentes tomavam sorvete, ele escorria pelas mãos e pingava no concreto, deixando- o melecado e colorido, do outro lado da rua, o supermercado, dali entrava e saia gente o dia todo, sacolas de todos os tamanhos, alguns arrancavam de dentro dela uma bebida, ou uma comida, e em seguida descartava ao chão formando assim um grande lixo até o final da tarde, ainda se via velhos sentados nos bancos da velha praça, papeavam, outros até carteavam, todo o tipo de povo andava por ali, a grande parte caminhando muito rápido, quase que uma corrida contra o tempo, a cidade nunca parava, apesar de sua decadência, era gigantesca, a ponto de engolir os que nela habitam. Ninguém, ou quase ninguém parava para olhar uma vitrina, ou uma escultura, ou até mesmo um prédio. Vez e outra alguns recebiam uma reforma, uma tinta, alguns reparos, cá e lá, sabe como é. Cada um com suas histórias, com seus aromas e energias dos que ali moraram. Uns elegantes, outros maltrapilhos, outros sem personalidade, opacos e vazios, cada prédio era singular. E eu gostava de entrar neles e sentir tudo isso, era como viajar em décadas passadas, ou até centenas, isso dependia do ano de nascimento de cada imóvel.

Na praça, havia uma excêntrica senhora que alimentava os pombos, a praça era cheinha deles, e quando ia se aproximando do entardecer, ela, miúda e forte, vinha com um balde cheio de comida, e assim era, todo o santo dia, chovia pombos, era lindo de se ver, era de uma poesia encantadora, fazendo os olhos brilharem por tamanha alegria. Havia muitos contratempos em relação à tal alimentação aos pombos, existiam aqueles que se posicionavam contra, outros ainda odiavam a atitude da velha chegando ao ponto de odiá-la também, desejando o fim daquilo, vários cidadãos chegavam ao ponto de envenenar as criaturas divinas. Quanta maldade! E aconteceu inúmeras vezes, de tempos em tempos encontravam-se pombos estatelados, mortos pelo simples fato de viverem no mesmo espaço dito, considerado urbanamente para humanos. Ah, humanos!!! Que tipo de gente faria tamanha malevolência.

A história da velha e os pombos não acaba aí, bem, na verdade sim e não. Neste inverno a idosa que alimentava os pombos faleceu. Tantos lamentaram, ela era uma figura histórica! Parecia uma personagem de algum filme francês, ali, por uma praça qualquer de Paris, particularmente sempre fiz uma conexão com aquela animação “A velha e os pombos”, brilhante!!! Genial!

The Old Lady and the Pigeons de Sylvain Chomet. Um curta bastante reflexivo e com bastante conteúdo filosófico, apesar de parecer uma simples animação.

Mas voltemos ao foco! Aquele prédio, aquele lá do início, decadentemente melancólico, era um antro das perdições. Durante o dia, avistava-se um gato preto em uma das janelas, especificamente a do terceiro andar de frente para a praça, em outra janela, virada para a outra rua, se via outro, em cores preto e branco. Estavam sempre por ali, olhando o mundo e muito provável, os pombos, com aquele desejo sórdido de devorá-los, ainda mais bem nutridos, fartos, os gatos sonhavam acordados e por sorte as janelas eram teladas, do contrário em suas viagens até o mundo dos pombos, poderia transformar-se em uma terrível tragédia. Se bem que, os andares não eram muito altos, com sorte, os gatos sairiam ilesos e ainda poderiam correr até onde os pombos se encontravam e ao menos tentarem fazer a festa. E dizem que gatos tem sete vidas!

Mas é quando a noite caia, que os gatos dormiam e os pombos se recolhiam que tudo mudava. Ali, neste velho prédio, gasto e desbotado pelo sol, moravam prostitutas, travestis, traficantes, usuários de drogas, toda esta gente enxotada, esculachada e marginalizada. Quando escurecia, entravam e saiam pessoas a todo o tempo.

As damas saiam para as ruas do grande centro, pelas esquinas, seminuas, com suas faces endurecidas de maquiagem, escondiam-se entre o ruge e o batom. Umas apareciam ao amanhecer, outras voltavam logo trazendo consigo um cliente amargurado, o doce noturno o amortecia.

Os cavalheiros, ficavam em estado de alerta, era um vuco vuco durante a madrugada inteira. As noites e madrugadas por ali eram verdadeiramente estonteantes.

Entre pombos e gatos, os ratos, estes que escondem-se para viver e talvez sobreviver! E a cidade os engolia lentamente, assim como ela faz com todos e ninguém enxerga!



A mulher de branco do relógio

 

A mulher de branco do relógio da cozinha



Havia um relógio antigo na parede da cozinha, era enorme, de madeira, muito antigo. Desde que a casa fora construída ele havia sido colocado ali, milimetricamente escolhido por Dona Anna, a proprietária da casa, naquele espaço, naquele cantinho da cozinha.

Muitos anos se passaram, o único filho do casal tornou-se adulto e foi embora, ficando então apenas o casal, envelhecendo cada vez mais, e a casa, naturalmente também sofria o mesmo processo e degradação.

Durante uma vida, ali na casa, aquele relógio nunca mudara de lugar, encontrava-se perto da porta que dá acesso aos demais cômodos, era como que um portal.

Nestas décadas que iam passando muito da mobília ia sendo substituída quando necessário, todavia o relógio nunca teve em si um arranhão se quer.

Dona Anna já passando dos seus bem vividos 80 anos, começava a apresentar sinais de esgotamento mental, lentamente sua memória iniciava um processo de adormecimento, seu neto que vivia muito distante pouco vinha ver os avós, mas quando a avó deu uma explícita piorada, ele compareceu imediatamente. O jovem tinha uma espécie de mediunidade, era espiritualmente evoluído, via coisas que outros nem imaginavam que existia, muito menos habitando seus lares, lugar de sossego e paz.

Logo no primeiro dia na casa dos avós, ele sentira algo muito estranho, pesado, ainda não sabia o que era, mas sabia que algo não ia bem. Na véspera do aniversário de seu avô algumas pessoas estavam presentes, reuniam-se na cozinha da casa para comemorar o aniversário do avô, o jovem neto olhou para o relógio e viu uma mulher esguia e pálida, com trajes brancos, intacta, apenas ali, não se movia, aliás, movia os olhos, apenas eles, não poderia se saber o porquê de estar ali, e então foi a primeira vez que ele a vira.

Ela acompanhava cada movimento das pessoas que estavam ali, sim, parece um clichê, de filme sobrenatural, ou de terror, aqueles que arrepiam as espinhas, mas não era, e creio não ter sido a imaginação do rapaz, ele já tivera experiências semelhantes anteriormente. Todavia, ele não sabia decifrar o enigma, se era uma boa ou má alma, e o motivo de estar ali.

Ele fora convidado para passar a noite lá, mas ao chegar no quarto onde dormiria, deu de cara com um ser nada agradável, outro fantasma, deitado na cama, tinha olhos vermelhos e profundos, retirou-se dali.

Alguns dias depois, na cozinha da casa dos avós, a mulher do relógio não estava mais lá.



segunda-feira, 20 de junho de 2022

Entre rosas e espinhos, o milho

 

  • Março de 1979, a família acabara de chegar a São Paulo, com toda a economia feita e com a herança do falecido pai, Jânio comprara uma velha casa ao final de uma rua pacata e bem arborizada.A casa precisava de algumas reformas, estava há muito tempo abandonada, pintura descascada,infiltrações, vazamentos, o portão de ferro, praticamente se via alguma pintura, bem como o cercado da propriedade, a energia precisava ser religada. O espaço era abundante, percebia-se que outrora o jardim fora muito bem cuidado, bem como a horta e plantação aos fundos do imóvel. Era realmente um bom espaço, com um velho poço aos fundos de onde em outra época fora um lindo milharal.Jânio pouco a pouco ia reformando a velha casa, e dando vida ao lugar, a mãe contava com boa saúde, era aposentada e gostava de mexer na terra, então dona Gertrudes, ficara com a responsabilidade de tomar conta do jardim, Dalila por sua vez, assumia a limpeza da casa e cozinhava, Jânio que durante o dia trabalhava como professor de direito, quando chegava em casa, ao final do dia, ia consertando tudo aquilo que necessitava, inicialmente foram as infiltrações e vazamentos, feito isso, começara a pintura na parte interna do imóvel, depois viria a pintura da parte de fora, e, por fim, grades e portão.

    E assim a vida passava calmamente, todos tranquilos e felizes na nova morada. Dia após dia, mês após mês, ano após ano….Desde a morte do pai, Jânio assumira fielmente todo o tipo de amparo e cuidados com a mãe e irmã era o provedor da família, dona Gertrudes contava 63 anos, enquanto a irmã caçula apenas 17 anos. Para o jovem adulto, com grandes responsabilidades, estava tudo bem, afinal não havia casado, tampouco tido filhos. Então cuidar da mãe e da irmã não era um problema, e sim uma satisfação, visto também, que era cuidado por ambas, afinal a irmã tomava conta da casa, cozinhava, a mãe gostava de cultivar as flores e os vegetais, logo, cada um cumpria com sua parte.

    Com o passar dos anos dona Gertrudes começara a adoecer lentamente, Dalila, já sem esperanças de uma vida diferente daquilo que vivera desde a infância, seus sonhos não cabiam em si, desanimava cada vez mais. Jânio, era um sovino solteirão e mal resolvido. De nada adiantava a irmã solicitar ajuda, estava definitivamente exausta de tantos afazeres domésticos, quanto mais o tempo passava, mais se desgastava, mais angustiada se sentia.

    O fardo começava pesar de acordo com os anos. A esclerose da mãe piorava, Dalila já passava a ser responsabilizada de tudo, ela não dava conta, era muito trabalhoso, exigia tempo e energia, e era preciso que alguém viesse para ajudá-la, ou melhor, assumir o comando da casa.

    Um enorme peso pairava sobre o lar da família, a hostilidade se instalara naquele local enquanto nada era feito. Mais alguns anos se passaram e Dalila não suportando mais a situação começava a pensar em como acabar com aquela situação maçante para si e pôr fim, e finalmente conquistar seus objetivos. Planejara silenciosamente o seu propósito diabólico.

    O ano era 1984, Dalila como de costume, todos os dias dava os medicamentos para a mãe, esta, incapacitada de fazê-lo sozinha, e dependendo absolutamente da filha para tudo, naquela tarde outonal, as folhas dos plátanos da rua caíam violentamente, havia bastante vento, a rua, como de costume se encontrava tranquila e praticamente inabitável, um gato atravessava a rua e subira no muro da velha casa, Dalila preparou os remédios que fizessem a mãe adormecer profundamente, e quando a idosa finalmente caiu em sono profundo, a jovem com um machado deu um golpe certeiro na velha, a enrolara em um cobertor, depois em um grande saco plástico, amarrara uma corda, e a enterrara no jardim da casa, jardim este, por anos cultivado pela mãe quando ainda exalava razoavelmente saúde. Em suas memórias, Dalila recordava o trabalho árduo para restaurar o solo rígido e iniciar a nova plantação das rosas vermelhas que por ali habitavam e ornamentavam o belo jardim cuidadosamente zelado por sua mãe. O momento era de tristeza aliado alívio, um sentimento estapafúrdio.

    O corpo da velha fora cuidadosamente depositado na cova feita por Dalila na noite anterior, em seguida pés de roseiras igualmente vermelhas preencheram o buraco onde a mãe dormiria e descansara para a eternidade.

    Jânio, ao final do dia, chegara em casa, exausto e com muito sono, sentara na mesa da cozinha e pediu que a irmã preparasse um chá, jamais imaginaria que no chá haviam ervas que danificariam sua vida, interrompendo-a bruscamenteDepois de ter bebido o chá quente, ainda comera uma torrada, fora até o banheiro, embebedou-se da ardente água que percorria pelo seu corpo, juntou uma toalha palidamente desbotadas causadas pelos danos de sua velhice, em seguida fora até seu quarto vestiu-se com um roupão azul acinzentado, quase que indefinível era a sua a cor, combinando com o restante do recinto mórbido, Jânio sentou-se na cadeira de balança, que rangia, fazendo um barulho estrondoso, como todas as noites estava lendo um livro, ele apreciava o tema criminais. Adormecera na cadeira, e esta, cada vez emitia menos barulho.

    Em meio à madrugada Dalila entrara no quarto do irmão, para averiguar se ainda vivia, o relógio tilintava 3 horas, Jânio não respirava mais, parecia estar adormecido, segurando o livro em suas mãos gélidas, uma manta cobria suas pernas, neste instante seu coração não pulsava mais, Jânio dormira para sempre. E o mesmo foi feito com seu imundo corpo de homem pão-duro, que passara parte da sua medíocre existência ceifando a jovem irmã de seus sonhos, seus desejos e sua ânsia de viver. Dalila já havia preparado o solo do quintal, não foi tão fácil, visto ali existia um milharal, quase que sem espaços, um pé do outro, deu trabalho, mas obteve sucesso no fim. A irmã fizera o mesmo que anteriormente cometera com a mãe, cobertores, plásticos e corda. Então depositou o corpo do irmão na vala.

    Feito o ato, missão cumprida! Ela dormira tranquilamente, sem pesadelos ou culpa, em seus ouvidos ressoava uma agradável canção que assemelhava a um anjo.

    Na manhã seguinte os pássaros celebravam alegremente o dia e o sol que surgia no límpido no horizonte, assim como as flores desabrochavam coloridas e vibrantes. Dalila com sua pequena mala de sonhos seguiu rumo à estação de trem.


terça-feira, 16 de junho de 2020

Olhos de abismo





Ao chegar à pequena cidade, ele não se vislumbrara como um jovem calouro, recém-saído do seio materno, saindo de casa pela primeira vez, para estudar, e, dali para frente possivelmente cortar o cordão umbilical. Esta fase, para ele, já havia passado há alguns anos. Chegando à universidade, direcionou-se até o curso de humanas, onde seguiria seus estudos com base na literatura britânica.
Ainda jovem, bem aperfeiçoado, um tanto misterioso, diga-se de passagem, taciturno e com ares melancólicos Harold com o passar dos dias não se pronunciara muito, pouco falava de si, de sua visão de mundo ou da própria crítica literária, se manifestava quando necessário e se, necessário.
Ficara inicialmente em um pequeno quarto de hotel. Hotel barato, sujo, com lençóis que podia-se duvidar se eram trocados quando os clientes antigos abandonavam os quartos. As lâmpadas eram escuras, as paredes desbotadas com algumas rachaduras. Ali ele permaneceu até que encontrasse um abrigo habitável, com melhores condições onde pudesse respirar ar puro, onde a luz fosse mais clara e pudesse fazer suas leituras noturnas.
Depois de mais um menos um mês naquele quase inóspito quarto de hotel, conhecera alguns colegas do curso de mestrado, e fora convidado a ir morar com eles, marcaram um dia para que fosse conhecer a pequena república. Esta, era espaçosa, tinha uma cozinha coletiva, dois banheiros, uma ampla sala de estar, duas salas de estudo, uma área de serviço com uma velha máquina de lavar roupas e 4 quartos, sendo 3 deles ocupados. Harold achou que era muito viável se mudar e no final de semana seguinte migrou para lá.
Ele possuía olhos de poço infinito, negros e sem brilho, de inteligência indiscutível, passara os quatro anos da graduação afundado nos livros, ninguém tinha a menor dúvida de que fosse o mais aplicado estudante da classe. Pouco se sabia sobre ele, discreto e de poucas palavras, mal fizera algum tipo de amizade. Morava em um pensionato. Lá contava por volta de dez rapazes, todos estudantes.
Em uma manhã ensolarada de sábado a dona da pensão aparecera repentinamente para cobrar o aluguel atrasado, dona Judite era uma senhora pacífica, dona de alguns dos pensionatos da cidade, era mulher de negócios e muito correta. Na manhã em questão foi até um de seus pensionatos, cujo aluguel estava com alguns dias de atraso, conversara com Guilhermino, o responsável pela locação. O jovem educadamente lamentara o ocorrido e a avisara de que o pagamento entraria em sua conta na semana seguinte. Judite, tranquila, foi embora sem nenhuma dúvida de que Guilhermino estaria lhe faltando com a verdade.
Passados uma semana e o combinado não sendo cumprido, Judite voltara à pensão a fim de resolver as pendências. Se locomoveu até lá novamente em um sábado e não obtera sucesso, não encontrara ninguém em casa.
Na semana seguinte, já passados quinze dias, ela voltara à casa dos estudantes, lá, encontrou Guilhermino lendo um livro na mesa da sala principal, bateu à porta e Guilhermino pediu que entrasse.
Entrou e já com pouca paciência alertou o jovem de que teriam poucos dias para pagarem o aluguel ou então seria obrigada a despejá-los. O jovem rapidamente aproximou-se da proprietária e disse que em breve a pagariam.
Judite dera mais uma semana de prazo para que acertassem o que deviam. Passado o prazo a proprietária do local voltara obstinada a receber o prometido. Guilhermino disse algumas palavras que não a convenceram, e ela tornara-se rude com o jovem, alegando de que os despejaria dali. Guilhermino desesperado arremessara um martelo sob a cabeça de Judite, em seguida, o sangue escorria por entre as tábuas do velho casarão. O jovem, assustado chamara seus colegas, que vieram rapidamente. A impressão que se tinha era de que a velha havia falecido, tamanha tinha sido a martelada em sua cabeça. O sangue penetrava lentamente nas velhas tábuas do casarão.
Quando seus colegas chegaram e viram a cena, assustaram-se e deram passos para trás desacreditando no que enxergavam. Eles viam Guilhermino como um ser calmo, pacífico e incapaz de fazer mal a uma mosca. Foi então que Harold, com seus olhos negros e profundo, taciturno, de poucas palavras, parecendo tão inofensivo, temendo o pior, instintivamente, para livrar o colega de qualquer mal, resolver martelar mais algumas vezes a cabeça da velha.
Dona Judite, desmaiada ao chão e sangrando, aos olhos de quem a via, parecia estar morta. Sem saber o que fazer, os demais garotos não agiram. As horas passaram, então, decidiram levar Judite ao hospital,ela ficou internada e diagnosticada com hemorragia cerebral. A notícia deixara sua família em estado de choque, através dos enfermeiros descobriram quem a levou ao hospital, foram atrás dos garotos, inicialmente negaram qualquer coisa, alegaram que a ajudaram, mas não deu certo, assim que pressionados confessaram a barbárie e entre eles tiveram que apontar o autor do crime, do contrário, se a matriarca da família não recuperasse completamente a saúde todos pagariam. Então acabaram falando toda a verdade, sendo o maior responsável Harold. Judite permanecera por alguns dias no hospital e, finalmente com o diagnóstico completo, depois de vários exames feitos, a conclusão era de que seu cérebro estava comprometido. Seus familiares ficaram perplexos com a notícia, Judite estava condenada a receber cuidados constantes, jamais recuperaria a memória bem como estava com delimitações mentais.
Depois de um tempo com a matriarca já em casa, sendo alimentada por outra pessoa, tomando remédios, precisando de alguém para trocá-la, de alguém para ajudá-la na locomoção, as pessoas já...já meio que tinham esquecido tudo, e a vida naquela pequena velha cidade abandonada às ruínas, que sobrevive por causa dos jovens estudantes começava voltar ao normal, digo isto por dois motivos, primeiramente, a velha é muito importante no vilarejo, e, sendo a cidadezinha muito pequena, não há nenhum tipo de violência, tirando uma briga de bar, e coisas do gênero, então o episódio das marteladas foi um acontecimento marcante para todos.
Inverno de 1996, algo inesperado, Harold tinha ido morar em um quarto de hotel depois do episódio da pensão. Estava muito frio, ele saíra de roupão do banheiro, o quarto estava cinza devido à água quente do chuveiro, havia pedido vinho e lasanha, quando deu o primeiro passo, foi surpreendido por três homens encapuzados e usando trajes escuro, amarraram-no, colocaram-no no carro e o largaram no trilho de trem.
Harold começara a se debater, e de repente sua fé se fez tão presente, que fé com sorte se entrelaçaram e ele conseguiu rolar e sair do trilho, porém, dali ele rolou, e rolou ribanceira a baixo, muito íngreme, rolou até a metade mais ou menos e ficou enroscado em uns galhos secos, não podia gritar, estava com longas e largas fitas em sua boca, também não podia se soltar, estava muito bem amarrado, ali permanecia, dia e noite, frio e chuva. Muito além bem lá embaixo, havia um pequenino vilarejo, agricultores ali viviam, lá do alto podia se ver as casinhas, carroças, os pequenos galpões, hortinhas e toda a plantação, era lindo de se ver.






quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

O Homem do futuro




Havia uma multidão, o fluxo de transeuntes indo e vindo era intenso, o trem parara em seu terminal e ela descera rapidamente. Vestia-se discretamente, roupas escuras, maquiagem discreta e óculos escuros, saíra apressadamente à direita, em seguida o fluxo de pessoas cessara e a rua ficara deserta, viera um homem em sua direção, usava moletom com capuz, não se podia ver o seu rosto, este se escondia entre o capuz e a barba. Conversara com ela, ela passou-lhe algo, não podia se saber ao certo o que era, talvez um aparelho celular. Logo, o homem caminhava para a esquerda e ela continuava rumo à direita. Entrou em um café, destes de esquina, todo fechado, com portas de vidro, em seguida saíra de lá fumando, olhava atenta para todos os lados, ficou ali parada fumando o cigarro, e depois de tê-lo fumado seguiu caminhando.
Seguiu algumas quadras da alameda sombreada e chegara ao final dela, um lago cercado de algumas árvores e bancos. Sentara ali e ao longe, dava a impressão de estar esperando alguém.
Não demorou muito a surgir um misterioso ser com um malote, aproximou-se da jovem, ainda em pé entregou-o para ela e seguira seu rumo.
A jovem pegou o malote e saiu caminhando vagarosamente rumo ao metrô. Anoiteceu.
Na manhã seguinte, chuvosa e fria, a moça se encontrava novamente no trem, acompanhada do malote, descera novamente no terminal caminhando apressadamente, encontrou no caminho um jovem , sem capuz e de barba feita, este entregou a ela um objeto pequeno, era um celular, e ela o entregou o malote e seguiram em direções opostas.
Ela voltara ao terminal da estação férrea e aguardara o seu trem, falava ao celular enquanto esperava. Pude constatar certa ansiedade e agonia. O trem chegara e ela partira.
Dois dias se passaram e ela não aparecera, mas no terceiro dia dera sinal de vida. Ao descer no terminal do trem, um homem a aguardava, este vestia terno e gravata, estava socialmente prateado, cabelo aparado, com gel, óculos escuros, luvas e uma pequena maleta. Os dois saíram dali e foram a um café, aquele da esquina, todo fechado e com portas de vidro, sentaram, ele abriu a maleta, olhou alguns papeis e em seguida entregou a ela alguns deles. Seguiram em rumos opostos.
Alguns dias depois saíra no jornal local, a notícia de que um misterioso homem cujas características são as mesmas do homem da maleta, hospedara-se em um dos hotéis da cidade e nesta madrugada lá ocorrera alguns assassinatos, onde a empregada, a proprietária do hotel e seu filho foram mortos.
A polícia travara uma busca implacável para encontrar o assassino. Avisos espalhavam-se por toda a cidade para que todos tomassem cuidado, estavam com um ilustre visitante na cidade e este já cometera três assassinatos. Nada fora roubado do hotel. O que a polícia suspeitou que os crimes ocorreram devido a uma vingança.
Este homem misterioso, de maleta, que se hospedara no hotel, viera do futuro, e, de fato fora ele que assassinara aquelas pessoas. E a polícia estava certa, ele matou mãe e filho porque estes mataram seu avô. A empregada fora morta por estar no lugar errado e na hora errada.
Ele desaparecera como se tivesse adentrado um grande portal. De volta para o seu lugar, o futuro.


quarta-feira, 31 de maio de 2017

A velha e os gatos

Capítulo I: A casa
A casa era grande e demasiadamente velha, a pintura desbotada, e algumas madeiras davam a impressão de que poderiam cair a qualquer momento, ficava perto de um velho pântano, de onde se podia ouvir o coaxar dos sapos, de um lado uma plantação de milho e do outro um jardim colorido com as mais diversas plantas e flores. Era poético de ser ver, tinha uma beleza exótica, lá vivia a velha Emília, ela contava pouco mais de 70 anos, ali nasceu, cresceu, casou, procriou, os filhos foram embora, o marido faleceu e lá, ela permaneceu. A vida em outras épocas já fora mais animada, ah, lembrava ela sentada na cadeira de balanço que rangia na velha área de madeira.
Capítulo II: A infância
A infância, os irmãos, os pais, aqueles almoços de domingo, a mãe assando os pães no forno de barro que havia nos fundos da casa, aqueles dias de calor e vento, e as roupas balançando no enorme varal, que, necessário devido ao número de moradores. Dos 6 irmãos, Emília fora a última a se casa. Os outros foram um a um partindo, sem olhar para trás, e raramente apareciam, em especial vinham em algumas datas comemorativas, traziam seus filhos e era aquela festa, a criançada no balanço da figueira, correndo atrás dos patos, andando a cavalo, jogavam laranjas para Gaspar, o cão fiel e amoroso da família. O dia findava e eles retornavam a suas vidas, a seus lares e a monotonia seguia calmamente como um rio manso.
Emília era a caçula, e fazia questão de ficar e tomar conta dos pais que iam rapidamente envelhecendo.
Capítulo III: as memórias
Era um hábito dela sentar-se na cadeira de balanço e recordar o passado, por vezes entrava, ia até um dos quartos, pegava as caixas com fotografias e revivia os momentos como se fizessem parte do presente. Emília guardava em sua ainda saudável memória todos os momentos vividos ali.
Capítulo IV: Solidão ou solitude?
Não há como dizer se ela era feliz sozinha, ou se sentia falta da família, de amigos ou vizinhos. Os últimos só eram encontrados com pelo menos 10 quilômetros de distância. Ali era uma região de fazendas, onde muitas delas foram herdadas e abandonadas, ou seus proprietários as desativavam e as casas iam ruindo com o passar dos anos.
Emília sempre teve muito apego àquele lugar, foi ali que viveu toda a sua vida. Não conhecia outras realidades, tampouco se interessava em conhecer. Ali era o seu mundo, o seu paraíso perfeito. Uma vez por mês tomava o trem que passava numa estação das proximidades, ia até a cidade, e depois de tudo resolvido retornava.
Assim sempre fora, é e será. Os filhos não a visitavam com muita frequência. Dos 4, o caçula ainda era o que mais vinha visitar a mãe.
Ficava muito contente quando os filhos vinham, e com eles, os netinhos, todos ainda crianças, alegravam a velha casa, traziam vida, corriam no jardim, colhiam cenouras frescas na horta, e a vovó os esperava com biscoitos e outras guloseimas coisas que em geral crianças adoram.
Capítulo V: A lucidez e boa disposição
Os filhos ficavam impressionados quando apareciam ao ver que, apesar da decadência da casa, a mãe mantinha tudo como fora no passado, a limpeza, os vasos de flores espalhados nos cômodos da casa, o jardim sempre vivo e colorido, a horta cheia de legumes e hortaliças, e ainda cultivava o milho, isso não era para qualquer um, a velha era realmente forte. Sempre muito feminina e delicada, com seus adoráveis vestidos florais, um aventalzinho de cor, um chapéu de palha na cabeça, afinal, como a lida era no campo tinha que se proteger do sol ardente, em geral a região era sempre mais gélida e úmida, mas nos verões por vezes, os dias eram escaldantes a ponto de derreter picolé em minutos.
Capítulo VI: O amor e respeito para com todos os animais
Emília tinha algumas vacas, de onde usufruía somente o leite, eram 3 ou 4 vaquinhas, cada uma com um nome próprio, a velha conversava com elas enquanto carinhosamente tirava-lhes o leite. As poucas galinhas viviam soltas a catar bichinhos, delas, somente os ovos, como estas vaquinhas e galinhas eram felizes, soltas, vistas e tratadas por Emília como seres vivos, não meros objetos “cultivados” rumo a carnificina. Aliás, peculiar, muito peculiar, visto que as fazendas das redondezas criavam gado para o abate, porcos e galinhas também tinham o mesmo fim.
Emília amava e respeitava muitos os seus animais e acreditava que eles mereciam o mesmo tratamento que qualquer outro ser vivo.
Capítulo VII: Os bichanos
E o que falar dos gatos da velha, Perdia-se a conta ao ver no final do dia aquela quantidade de bichanos, todos em volta esperando o leite fresco das vacas. Devia passar dos 20, eram muitos, e assim como Emília, não comiam carne, comiam o mesmo que ela e adoravam leite. Quando um animal adoecia, Emília tinha de pegar o trem e ir até a cidade chamar o veterinário, que vinha imediatamente reparar os animais doentes.
E assim vivam em harmonia, o meio ambiente, tudo que ali habitava, vivia bem, com qualidade de vida e a paz reinava.
Estes eram os verdadeiros companheiros, os que sentavam no colo enquanto tricotava u lia algo, espalhavam-se pelos cômodos, esticavam-se a tirar longas sonecas nos sofás da casa, dormia com a velhota na cama, e aí sem um ficasse para o lado de fora do quarto, miavam até que Emília abrisse a porta.
Emília os cumprimentava pela manhã com um bom dia e um afago na cabeça, quando ia rumo ao milharal plantar ou colher os milhos, aquela linda e adorável de gatos a acompanhavam alegremente, esfregando suas caudas em seu vestido, por vezes Emília tinha que lhes chamar a atenção, pois a acariciavam tanto que acabavam por atrapalhar o trabalho.
Quando ia para o jardim, o mesmo acontecia, se esfregavam e cheiravam as flores, quando ela retornava para dentro de casa eles a seguiam rapidamente, como que, como medo de perdê-la de vista.
Capítulo VIII: A viuvez
O velho falecido morrera já há 10 anos, adquirira tuberculose, sabe como é, se sentia um garotão, não cuidava da saúde, em épocas de frio, com a umidade e as chuvas, vestia-se em poucos trajes, Emília sempre o alertava, mas o velho não lhe dava ouvidos, pensava que nunca ia adoecer, muito menos morrer, pensava ele que seria eterno.
Fora um choque para a família, tudo acontecera tão rapidamente, que não nem tempo de levar o velho ao hospital, fazer exames e internar para um tratamento. Até hoje Emília pensava, se o velho não fosse tão teimoso ainda estaria vivo. Mas, com o tempo tudo se cura, as feridas se fecham e a vida segue, rumando para lá e para cá. Como ela própria dizia, viver é navegar em um rio onde não se pode medir a profundeza, não tem como saber sem virá uma tempestade de surpresa, ou se podemos ser atacados por selvagens canibais, ela assim se referia à vida como uma caixinha melindrosa e misteriosa.
Capítulo IX: Os rebentos
Emília apesar do pouco contato com a prole, os amava muito e era demasiadamente feliz com os filhos.
Dos 4 filhos, 2 deles viviam muito distante, poderia se dizer que do outro lado do país e os outros 2 não tão distantes, porém nem tão perto, o caçula, que era o que mais aparecia, morava a aproximadamente 500 quilômetros. E até mesmo este custava a dar as caras.
De vez em quando, uma correspondência daqui, dali, ela ficava toda feliz e respondia no mesmo dia. A relação mãe e filhos era boa, porém sem muito contato físico, visto que ada um casara, formara família e abandonara a vida no pequeno vilarejo.
Capítulo X: O natal, última reunião em família
No dia 24 de dezembro daquele ano, os filhos da velha prepararam uma boa surpresa para a mãe, combinaram entre si que todos apareceriam na noite de natal, e assim foi.
Contava pouco depois das 17 horas, Emília como de costume, tirara o leite das vacas, alimentara os gatos, fora até a horta pegar algumas hortaliças e entrara para tomar um banho, naquela noite estrava um tanto frio, e ela não queria correr o risco de pegar um resfriado.
Banhou-se e fez um fogo na lareira, e começara preparar a ceia, pôs à mesa pães, uma deliciosa sopa de vegetais e abrira uma garrafa de vinho, fora até a sala e acenderá as luzes da árvore natalina, que era sagrada, passasse sozinha ou em companhia sempre a montava.
Quando saiu à área para ligar as luzes coloridas que contornavam o oitão da casa, vira um carro chegando, olhou atenta e esperou o carro se aproximar, dele desembarcaram o caçula, a esposa e o neto de 4 anos. Correu e os abraçou saudosamente, convidando-os para entrar, pensou ela que só havia preparado uma sopa de legumes, mas daria um jeito de agradá-los. Emília era esperta e ágil, logo logo prepararia um jantar especial. O filho alertou-a de que não se preocupasse, pois havia trazido alimento para a ceia.
Entraram, levaram as malas até o quarto dos fundos, o garoto fora correr lá fora, rumo ao balanço da centenária figueira e os pais assim que levaram as malas para o quarto, voltaram para o quarto e pegaram a comida ara a ceia, para a surpresa de Emília trouxeram uma grande variedade de saladas e um peru assado. Tudo bem, matutara ela, eles vêm tão pouco e não é porque não me alimento de cadáveres que eles não podem usufruir o mesmo.
Logo em seguida mais 2 carros, a velha saíra para fora, eram os 2 filhos do meio com suas esposas e a filha de um dos casais. Todos se abraçaram alegremente e foram entrando, a mãe disse que um dos casais poderia se instalar no quarto ao lado do corredor e o outro no quarto do sótão.
A netinha com pouco mais da idade do neto do caçula tinha 7 anos, depois de dar um apertado abraço na avó fora ao balanço com o primo mais novo.
A mãe preocupada com a comida, se ia alimentar a todos, começara um refogado com todo o tipo de legumes, foi quando um dos filhos disse que haviam trazido comida, e foram desempacotando uma parte de um porco assado, arroz colorido e vinhos. Que fazer pensou ela, ao menos fome não irão passar.
Passados 1 hora, por volta das 20 horas, o quarto filho chegou sozinho, a mãe não sabia se ficara mais surpresa pela reunião de todos os filhos ou pelo filho ter chegado sozinho. Sem alardes desceu do carro trazendo a sobremesa na mão, era uma torta de maçãs, e com o passar do tempo, a mãe sem investigar deixou que o filho contasse o que havia acontecido com a esposa, pois chegara só, algo incomum, visto que costumavam viajar sempre juntos.
Pouco antes do jantar ele falou do divórcio, que surpreendera a todos e mantiveram-se discretos, respeitando-o.
Depois do jantar, todos se dirigiram à espaçosa sala, bebiam vinho, conversavam e riam, as crianças brincavam com os felinos, já de madrugada cada um foi se dirigindo aos aposentos.
Na manhã seguinte Emília os aguardava com a mesa farta para o café da manhã, ah, que momento especial e feliz pensava ela. Levantaram tarde, tomaram o café, uma manhã agradável, depois foram tomar sol e caminhar por entre o milho e o jardim. Fizeram questão de elogiar a boa disposição e cuidados da mãe para com tudo.
Antes do almoço, todos foram arrumando as malas e partindo, ficara a alegria, as lembranças e o doce vazio da partida da pequena família.
Mas a vida é assim mesmo falava ela sozinha, há a hora de chegar, de permanecer e partir.
Capítulo XI: A saudade
Emília, como nunca antes havia sentido esta sensação de saudade, de perca, de ausência, naquela manhã em especial sentira-se triste e solitária, a velha era forte e fora vista poucas vezes chorando, mas aquela manhã era diferente, nem ela sabia explicar o que tomava conta de si. Sentou-se na cadeira de balanço, as lágrimas escorriam e ela as secava com o avental.
Depois de um longo tempo, ali, intacta, levantara-se e fora tomar um banho.
As horas foram passando e Emília não saia do banheiro, algo poderia ter acontecido, poderia ter passado mal, desmaiado ou adormecido na banheira com água quentinha. Talvez fosse o desejo dela permanecer lá por bastante tempo, como uma forma de dar leveza na alma. Porém, aquela situação fugia do habitual.
Capítulo XII:
Durante a madrugada Emília saíra atônita e confusa do banheiro, parecia ter perdido os sentidos, com os olhos embaçados caminhara lentamente e meio cambaleando até o quarto, secou-se e vestira um pijama, deitara-se lentamente na cama, cobriu-se com cobertas quentes e adormecera.
A porta ficara semiaberta e rangendo a cada gato que adentrava ao aposento, aos poucos, todos os seus felinos entraram e foram se acomodando ao lado da velha, todos dormiam um sono inabalável.
Capítulo XIII: A morte e o canibalismo
Aquela era a cena mais bela que se podia dizer, se não fosse o fatídico e aterrorizante acontecimento que assombrou aquele casarão.
Aproximadamente 1 mês depois do natal, o filho mais velho de Emília veio até a casa da mãe a fim de passar uns tempos e dar paz à mente, visto que havia passado por um momento doloroso, o divórcio, ali parecia um bom lugar para acalantar o coração junto com a mãe e toda a natureza que a cerca.
Chegou, e encontrou as lâmpadas de natal ligadas, isto já passados quase 30 dias das festas natalinas, a porta e janelas fechadas. Bateu e não fora recebido por ninguém, pensara ele se talvez a mãe tivesse viajado, ou id o à cidade, mas as luzes coloridas o preocuparam. Foi quando arrombou a porta e por suas narinas foram invadidas por um terrível cheiro, aquilo cheira podre, o aroma era de morte. Com certo receio fora indo rumo ao quarto da velha mãe, abriu a porta que se encontrava semiaberta e se deparou com aquela cena horripilante, cuja qual jamais esquecera. Os restos mortais da mãe espalhados pela cama, já não possuía mais forma, nem seus trajes podiam ser reconhecidos. A velha fora devorada pelos amigos felinos e posteriormente, já sem alimento, os bichanos cometeram canibalismo, alimentando-se uns dos outros.
Os restos mortais da mãe e dos gatos foram enterrados no jardim que ela cuidara e cultivara a vida toda com amor do mundo. O filho enlouquecera e fora internado para tratamento psiquiátrico, os médicos diziam que o linguajar eram miados impossíveis de se compreender.
Com o passar do tempo os outros filhos venderam o casarão para uma família adoradora de gatos, com eles se mudaram 13 felinos.



segunda-feira, 29 de maio de 2017

Entre o real e o imaginário

Amanhecera, ela sem saber como se encontrava despida ao chão gelado. Lá fora contavam temperaturas abaixo de zero graus. Levantou, sentiu-se tonta e tentou chegar até o banheiro, sentou-se no vaso e lá permaneceu com a cabeça baixa, refletia a vida ali mesmo, sem roupas, uma dor de cabeça estonteante. Depois de um bom tempo tomara uma ducha quente e saíra dali, vestira um roupão, fizera um chá e, sentara-se em frente ao televisor, procurou algo para ver, nada de interessante, desligou-o e fora rumo à cama. Lá não conseguira permanecer por mais de 10 minutos, se virara de um lado para o outro, era como se houvesse pregos na cama, os empurrando dali rumo ao chão.
A lucidez inexistia, levantara e caminhara pela casa, de um lado a outro, lá fora chovia, o cinza se fazia presente na paisagem urbana. Do lado de fora, pela janela dos fundos, podia-se ver o vento dançando, o vento assoviando.
Deitou-se no sofá e adormecera, ali, com frio e um certo vazio tomando conta do espaço por ela ocupado, sonhara que estava em um penhasco, no momento em que rolaria para baixo acordara assustada, e percebera que tinha sido apenas um sonho. Não demorou muito para que caísse em sono profundo.
O mundo fantasioso e lírico tomara conta de sua mente novamente, o sonho, desta vez mais agressivo que o anterior, dormia ao chão, ao lado dela, se encontravam diversas facas, de vários tamanhos, cores e navalhas, umas mais cortantes, outras que não ofereciam muito perigo, as facas miravam em sua direção como se tivessem vivas, começou rastejar pelo assoalho, elas vinham em sua direção como se ela fosse o alvo único e perfeito, de repente as facas começavam a falar, inicialmente ela não compreendia nada.
Minutos depois entendera que as facas desejavam agredi-la, ela não tinha forças para levantar e fugir, parecia uma serpente congelada, se movendo lentamente.
Fora encurralada em uma parede, sem mais ter para onde fugir, uma a uma fora a cortando lentamente, o sangue escorria, e ela não tinha forças nem mesmo para gritar, e com aquele vento lá fora, quem a ouviria?
Elas deslizavam pelo seu corpo, desenhando em cada fragmento dele. Percorriam como se fosse em câmera lenta, a dor era ainda suportável, e isto durou um tempo, tempo suficiente para banha lá em um líquido vermelho e gosmento.
Por fim, as facas maiores e mais afiadas começaram a cortá-la em partes, no final restara o tronco, todos os membros decepados e ao lado a cabeça mentalizando o porquê.
Seu inconsciente respondera que era um desejo oculto, e ela finalmente morrera.

Acordara e percebera que todos os seus membros se encontravam acoplados. Fora um pesadelo dos mais terríveis que tivera. Permanecera em silêncio, ali, deitada ao chão, a campainha tocara....